Todo o processo de concepção da Residência do Vale começa com o vale sem a casa, ou melhor, com a confrontação do arquiteto com o espaço natural. Começou definindo intenções. A vontade era de respeitar a topografia local e de levar as pessoas a usufruir de 10.000m² de área disponível. Queria criar um volume proporcional em relação ao terreno. A ideia de um objeto perdido em um espaço vasto não me satisfazia, para chegar a um elemento grande e compacto incrustado no terreno.
Para desenvolver a planta da casa, me baseei em uma tipologia tradicional da região. Uma grande galeria ocupa o centro da casa enquanto as divisões restantes se organizam ao redor dela, exigindo seu lugar. A simplicidade e lógica da tipologia tradicional permite sua adaptação ao tempo.
A casa está orientada para o vale e as montanhas, a piscina se localiza no lado oposto, no telhado com sua cobertura vegetal. Era de desejo do projeto que houvesse uma forte relação entre o interior e o exterior, mas não diretamente, ou melhor, teria que haver um amplo contato visual, mas a transição física de um lugar para o outro não poderia ser imediata. A natureza em seu esplendor e a fauna selvagem imporia respeito. Por isso, as grandes aberturas são mais altas que o nível externo, o que as transforma em plataformas de contemplação. A diferença de nível entre o espaço interno e externo é suficiente para transmitir conforto e segurança nos duas de isolamento absoluto.
Quando entramos no lugar, podemos ver a casa escondia atrás da natureza sem nenhum caminho construído, o que faz com que a vejamos como um elemento isolado no espaço. A primeira impressão que temos, quando chegamos na planície do vale, não mostra a forma verdadeira da casa, depois, a medida em que caminhamos pelo terreno, descobrimos o resto gradualmente e isso provoca um efeito de surpresa quando finalmente se alcança tudo. Este “elemento surpresa” (Montesquieu) contribui para estimular o observador e sua percepção da relação entre o lugar e a casa. A experiência arquitetônica foi feita em sua base de estímulos sensoriais. Este projeto buscava, da melhor maneira possível, explorar sensações através da percepção do espaço.
A entrada é um espaço externo coberto que dá acesso a garagem e ao interior da casa. As escadas levam ao hall de entrada, que separa a galeria da sala de estar. Na sala de estar nos deparamos com uma grande cortina que a divide em dois ambientes íntimos: um introvertido, com a chaminé e o outro que se abre para o exterior. Este último nos pega de surpresa ao mostrar pela primeira vez a estupenda vista das montanhas. O trajeto completo pelo interior da casa se faz com as montanhas às costas, de tal maneira que não podemos ver sua beleza até este momento. Cada espaço tem uma relação com os arredores que conferem uma identidade única a eles. A galeria aberta, protegida pelas árvores, é uma oferenda da natureza, onde podemos nos perder dentro de nós mesmos.
A área dos dormitórios consiste em dois núcleos idênticos, com um hall, dois dormitórios e banheiros. As habitações têm acesso ao jardim posterior que leva à piscina. Finalmente, para fechar o corredor e sua coerência com a tradição regional, a cozinha e a sala de jantar estão no mesmo recinto.
A casa é feita de concreto, utilizado como elemento construtivo e de fechamento, buscando um material duto e contrastante esteticamente com as cores e as texturas diversas da natureza que a rodeia.
Em seu interior, o contraste está enfatizado através da cor neutra que cobre paredes e céus e pela maneira “monótona” em que os espaços são desenhados. O refúgio foi uma questão de sobrevivência para o homem, uma transformação em sua existência, o essencial continua. Essa casa não tem a intenção de ser mais do que um refúgio para o corpo e a alma. Sem refúgio, somos pedras embaixo da chuva.